Salmos 44

Com os nossos próprios ouvidos ouvimos, ó Deus; os nossos antepassados nos contaram os feitos que realizaste no tempo deles, nos dias da antigüidade.
*
O salmista inicia lembrando das tradições orais passadas por gerações, prática comum na cultura hebraica (ver deuteronômio 6:20-25).
Com a tua própria mão expulsaste as nações para estabelecer os nossos antepassados; arruinaste povos e fizeste prosperar os nossos antepassados.
Não foi pela espada que conquistaram a terra, nem pela força do braço que alcançaram a vitória; foi pela tua mão direita, pelo teu braço, e pela luz do teu rosto, por causa do teu amor para com eles.
*
A conquista de Canaã é atribuída exclusivamente à intervenção divina, não ao poder militar israelita - ecoando o relato de Josué 6:20-21 sobre Jericó.
És tu, meu Rei e meu Deus! Tu decretas vitórias para Jacó!
Contigo pomos em fuga os nossos adversários; pelo teu nome pisoteamos os que nos atacam.
Não confio em meu arco, minha espada não me concede a vitória;
mas tu nos concedes a vitória sobre os nossos adversários e humilhas os que nos odeiam.
Em Deus nos gloriamos o tempo todo, e louvaremos o teu nome para sempre. Pausa
Mas agora nos rejeitaste e nos humilhaste; já não sais com os nossos exércitos.
Diante dos nossos adversários fizeste-nos bater em retirada, e os que nos odeiam nos saquearam.
Tu nos entregaste para sermos devorados como ovelhas e nos dispersaste entre as nações.
Vendeste o teu povo por uma ninharia, nada lucrando com a sua venda.
Tu nos fizeste objeto de vergonha dos nossos vizinhos, de zombaria e menosprezo dos que nos rodeiam.
Fizeste de nós um provérbio entre as nações; os povos meneiam a cabeça quando nos vêem.
Sofro humilhação o tempo todo, e o meu rosto está coberto de vergonha
por causa da zombaria dos que me censuram e me provocam, por causa do inimigo, que busca vingança.
Tudo isso aconteceu conosco, sem que nos tivéssemos esquecido de ti, nem tivéssemos traído a tua aliança.
*
Afirmação de inocência coletiva contradiz a teologia deuteronomista tradicional (sofrimento como castigo por pecados), criando tensão teológica similar ao livro de Jó.
Nossos corações não voltaram atrás, nem os nossos pés se desviaram da tua vereda.
Todavia, tu nos esmagaste e fizeste de nós um covil de chacais e de densas trevas nos cobriste.
Se tivéssemos esquecido o nome do nosso Deus e tivéssemos estendido as nossas mãos a um deus estrangeiro,
Deus não o teria descoberto? Pois ele conhece os segredos do coração!
Contudo, por amor de ti enfrentamos a morte todos os dias; somos considerados como ovelhas destinadas ao matadouro.
*
Esta frase é citada por Paulo em romanos 8:36 para descrever perseguições cristãs. Também ecoa isaías 53:7, associado ao messias sofredor.
Desperta, Senhor! Por que dormes? Levanta-te! Não nos rejeites para sempre.
*
Questionamento dramático da aparente inação divina, similar a outros salmos de lamento (salmo 7:6; 35:23). Reflete crise de fé coletiva pós-exílio.
Por que escondes o teu rosto e esqueces o nosso sofrimento e a nossa aflição?
Fomos humilhados até o pó; nossos corpos se apegam ao chão.
Levanta-te! Socorre-nos! Resgata-nos por causa da tua fidelidade.