Concordia do Livre Arbítrio - Parte IV 3

Parte IV - Sobre a presciência de Deus

Disputa XLIX: Deus conhece com certeza as coisas futuras contingentes porque elas estão presentes para Ele segundo sua existência e, graças a isso, sua contingência pode ser bem conciliada com a presciência divina?

1. No trecho citado, Santo Tomás, seguindo os passos de Boécio (De consolatione philosophiae, livro 5, prosa final), oferece uma resposta afirmativa, que se baseia nos seguintes fundamentos, que não vamos apresentar na mesma ordem em que ele o faz.
Primeiro fundamento: Como a eternidade, enquanto duração indivisível e infinita, existe em sua totalidade simultaneamente e abrange a totalidade do tempo, todas as coisas que acontecem sucessivamente e que se produzem no tempo, estão desde sempre presentes para Deus, segundo o mesmo ser —embora de maneira extrínseca às suas causas— que adquirem sucessivamente no tempo; por isso, como o conhecimento divino —assim como o ser divino— se mede em termos de eternidade, o conhecimento divino se dirige desde sempre e com simultaneidade para todos os atos contingentes, enquanto que, na duração da eternidade, esses atos se encontram em forma presente para Ele, segundo o mesmo ser de existência —embora de maneira extrínseca às suas causas— que possuirão no decurso do tempo.
2. Segundo fundamento: Qualquer ato contingente pode ser considerado de duas maneiras. Primeiro: na medida em que existe em si mesmo de maneira extrínseca às suas causas; segundo este primeiro modo, não o consideramos futuro, nem contingente, mas presente e absolutamente determinado; considerado desta forma, pode ser objeto de conhecimento certo e infalível; pois com certeza vejo que Sócrates está sentado, quando se encontra sentado em ato. Segundo: na medida em que ainda se encontra em sua causa; segundo este segundo modo, o consideramos um ato futuro e contingente, que ainda não está absolutamente determinado, porque sua causa contingente pode agir de maneira indiferente ao oposto; se considerarmos um ato contingente segundo este segundo modo, este ato não poderá ser objeto de conhecimento certo e infalível; por isso, todo aquele que conhece um efeito contingente apenas em sua causa, não possui um conhecimento certo desse efeito, mas apenas conjectural.
3. A partir desses dois fundamentos, Santo Tomás infere que, como o entendimento divino conhece todos os futuros contingentes não apenas na medida em que se encontram em suas causas, mas também na medida em que cada um deles existe em si mesmo em ato segundo seu ser de existência ─que está em forma presente aos olhos divinos de maneira extrínseca a suas causas─, como é evidente em virtude do primeiro fundamento, por isso, Deus conhece com conhecimento certo todos os atos contingentes, apesar de que cada um deles seja no tempo um futuro contingente com respeito a suas causas. Santo Tomás sustenta desse modo que a contingência das coisas no tempo, uma vez relacionadas com suas causas, concorda com a presciência certa e infalível de Deus. Isso mesmo ele afirma em De veritate (q. 2, art. 12) e em Contra gentes (liv. 1, cap. 67).
4. Mas não se sabe se, apenas por essa razão, Santo Tomás teria sustentado que Deus possui uma ciência dos futuros contingentes certa e imutável ou se, além disso, teria dito tal coisa porque Deus estaria em posse de ideias em virtude das quais, após a determinação livre de sua vontade, conheceria os futuros com certeza, embora estes não se encontrassem presentes para Ele segundo suas existências, como examinaremos com maior extensão na disputa seguinte e na penúltima.
5. Comentando esta passagem, Cayetano afirma o mesmo, assim como outros discípulos de Santo Tomás, que o apoiam, quando neste artigo diz: 'Daí que tudo o que existe no tempo esteja presente para Deus desde sempre, não apenas por ter presentes em si mesmo as razões das coisas, como dizem alguns, mas porque seu olhar se dirige desde sempre para todas as coisas, na medida em que se encontram em sua presencialidade'. Pois quando diz 'por ter presentes em si mesmo as razões das coisas', Santo Tomás parece dar a entender as ideias das coisas, como Cayetano e alguns outros afirmam, comentando esta passagem; Santo Tomás parece afirmar que os futuros existentes no tempo se encontram de forma presente para Deus como objetos conhecidos com certeza por este motivo, a saber, porque em si mesmo Deus estaria em posse das razões das coisas, embora não unicamente por este motivo, mas também porque seu olhar se dirigiria para todas essas coisas como presentes para Ele segundo seu ser de existência.
6. No entanto, poderia se argumentar que Santo Tomás teria defendido a opinião contrária, em primeiro lugar, porque, em relação ao segundo fundamento, ele distingue um duplo estado no futuro contingente: um, enquanto existe em ato de maneira extrínseca às suas causas; outro, enquanto ainda existe em sua causa; Santo Tomás afirma que o futuro contingente pode ser objeto de conhecimento certo de acordo com o primeiro modo, mas não de acordo com o segundo; em De veritate (q. 2, art. 12 in corp. e ad sextum) Santo Tomás parece afirmar claramente que, considerada dessa maneira, uma coisa contingente não pode ser objeto de conhecimento certo para o conhecimento divino. Por essa razão, no lugar citado, ele acrescenta: «Por isso, todo aquele que conhece um efeito contingente apenas em sua causa, não possui um conhecimento certo desse efeito, mas apenas conjectural». Em segundo lugar, porque se Santo Tomás tivesse acreditado que as razões das ideias por si bastam para que Deus conheça os futuros com certeza antes que aconteçam seja no tempo, seja na eternidade de maneira extrínseca às suas causas: ele teria explicado isso mais detalhadamente; teria se aprofundado em explicar o modo pelo qual, em virtude das razões das ideias, Deus poderia conhecer com certeza o que está na faculdade do livre arbítrio criado; teria explicado de que modo a liberdade do arbítrio concordaria com a presciência divina considerada dessa maneira; e não teria se preocupado tanto, primeiro, em explicar a certeza da presciência divina exclusivamente em razão da presença das coisas segundo seu ser de existência na eternidade e, segundo, em conciliar apenas a contingência das coisas com a certeza da presciência somente por essa razão. Em terceiro lugar, porque se Santo Tomás tivesse pretendido sustentar, com as palavras que citamos anteriormente, que Deus tem, por uma e outra razão, ciência certa dos futuros contingentes, então ele teria dito: Daí que tudo o que existe no tempo, esteja presente para Deus desde sempre, não apenas por ter presentes em si mesmo as razões das coisas, como dizem alguns, mas «também» porque seu olhar se dirige &c.; pois isso indicaria de modo mais verossímil que Santo Tomás teria pensado que ambas são razões suficientes. No entanto, como o fato de que as razões das ideias sejam razão suficiente para conhecer com certeza os futuros contingentes, não concorda com a doutrina que Santo Tomás ensina no segundo fundamento; como ele não diz: «mas também porque &c.», mas apenas diz: «mas porque &c.»; como, além disso, uma razão legítima pela qual, com essas palavras, ele não exclui totalmente as razões das ideias, que é a seguinte, a saber: que essas palavras não falam apenas da presença dos futuros contingentes, mas da presença de tudo o que existe no tempo, entre o qual muitas coisas que são necessárias e muitas coisas cujas produções têm causas determinadas e, no entanto, podem ser impedidas e para que todas as coisas que são necessárias e têm causas determinadas, se encontrem presentes para Deus com certeza segundo seu ser objetivo, bastariam as razões das ideias, especialmente se todas agem por necessidade de natureza —, por isso, não devem ser excluídas as razões das ideias e, consequentemente, Santo Tomás diz: «Daí que tudo o que existe no tempo, esteja presente para Deus desde sempre, não apenas por ter presentes em si mesmo as razões das coisas (e isso é como se dissesse: pois essa razão sozinha não basta para que todas essas coisas, também segundo seu ser objetivo, se encontrem presentes para Deus de tal modo que Ele as conheça com certeza), mas porque seu olhar &c.»; e é como se dissesse: esta é a razão universal pela qual todas essas coisas se encontram presentes para Deus de tal modo que Ele as conheceria todas com certeza, incluindo os futuros contingentes; assim, que, como digo, tudo isso é assim, é verossímil que Santo Tomás não quisesse afirmar no lugar citado que Deus conhece com certeza os futuros contingentes também por meio das razões das ideias.
7. Mas, para expressar o que penso sobre toda essa questão, em primeiro lugar, sem que as razões que acabamos de apresentar representem qualquer impedimento, não me atreveria a afirmar que Santo Tomás a quem desejo ardentemente ter em tudo como patrono antes que como adversário acreditasse que, apenas em razão da presença das coisas segundo seu ser de existência, Deus conhece com certeza os futuros contingentes. Pelo contrário, me parece que, se examinarmos essa questão com atenção, Santo Tomás teria afirmado o oposto.
Digo isso, em primeiro lugar, porque, em Contra Gentes (livro 1, capítulo 67, razão 3), Santo Tomás demonstra que Deus conhece os futuros contingentes, pois, assim como um efeito necessário é conhecido com certeza a partir de uma causa necessária, da mesma forma, um efeito contingente é conhecido com certeza a partir de uma causa contingente completa, desde que sua ação não seja impedida. Portanto, como Deus não apenas conhece as causas dos efeitos contingentes, mas também as causas que podem impedir seus efeitos, por essa razão, segundo Santo Tomás, Deus conhece com certeza os futuros contingentes a partir de suas causas. No entanto, também é verdade que, ao comentar essa passagem, o Ferrariense apresenta essa razão, mas não a aplica aos futuros contingentes cuja causa é o livre-arbítrio pois, se nada o impedir, está no poder do livre-arbítrio produzir ou não produzir um efeito, ou produzir um efeito em vez do efeito contrário —, mas sim aos futuros contingentes que procedem de causas naturais, que estariam determinadas por sua própria natureza a produzir efeitos específicos, mas que também seriam causas contingentes na medida em que a produção desses efeitos pode ser impedida.
Dizer isso também me motiva, em segundo lugar, o fato de que sustentar o que se atribui a Santo Tomás, tiraria dignidade da ciência divina ou, mais ainda, seria perigoso em matéria de fé, para não dizer algo mais. Não posso me persuadir de que Santo Tomás tenha sustentado algo que, em certa medida, tira dignidade da ciência divina e é pouco coerente com a católica, especialmente quando não nada que obrigue a isso, indícios não desprezíveis do contrário e tantos homens doutos afirmam que Santo Tomás sustentou, baseando-se também nas razões das ideias, que Deus está em posse de uma ciência certa dos futuros contingentes.
8. Portanto, nesta disputa, vamos apresentar nossa primeira conclusão: Deus não conhece com certeza os futuros contingentes exclusivamente porque as coisas possuem uma existência na eternidade de maneira extrínseca às suas causas, mas, em virtude da altura de sua ciência, antes —segundo nosso modo de entender, mas com fundamento na realidade— de decidir algo, em si mesmo compreende todas as coisas que —de modo contingente ou puramente livre, por meio de todas as causas segundas possíveis em virtude de sua onipotência— vão acontecer, dada a hipótese de que Ele queira estabelecer estes ou aqueles ordens de coisas, com estas ou aquelas circunstâncias; em razão de ter decidido estabelecer, por sua livre vontade, esta ordem de coisas e de causas que realmente decidiu, antes não de que algo aconteça no tempo, mas também —segundo nosso modo de entender, mas com fundamento na realidade— de que algo criado possua existência na duração da eternidade, em si mesmo e em seu decreto compreende todas as coisas que, por meio de causas segundas, de modo contingente ou livremente, realmente vão acontecer ou não.
9. A primeira parte desta conclusão e ainda mais as demais possui tanta certeza que não duvido de que sustentar o oposto é perigoso em matéria de fé.
Primeira demonstração: É evidente, pelo que dizem as Sagradas Escrituras, que Deus Ótimo Máximo possui um conhecimento certo de alguns futuros contingentes que dependem do livre arbítrio humano e que, no entanto, não aconteceram, nem acontecerão nunca, e, por isso, também não possuem existência na eternidade; portanto, Deus não os conhece com certeza exclusivamente porque os futuros contingentes possuem uma existência na eternidade de maneira extrínseca às suas causas.
A consequência é evidente; o antecedente é demonstrado assim: Deus sabe que os tírios e sidônios teriam feito penitência em cilício e cinza, dada a hipótese de que em Tiro e em Sidônia tivessem ocorrido os milagres que aconteceram em Corazim e em Betsaida, como é evidente pelo que lemos em Mateus 11,21: 'Se em Tiro e em Sidônia tivessem sido feitos os milagres que foram feitos em vós, muito tempo teriam se convertido em cilício e cinza'. Como de fato a hipótese, sob a qual essa penitência teria ocorrido, não se realizou, ela nunca ocorreu, nem ocorrerá, e, no entanto, tratava-se de um futuro contingente dependente do livre arbítrio dos homens. Da mesma forma, em 1 Samuel 23,10-12, Davi perguntou ao Senhor se Saul desceria a Queilá, e o Senhor respondeu: 'Descerá'. Ele também perguntou se os homens de Queilá, que tantos benefícios haviam recebido de Davi, o entregariam a ele e aos homens que o acompanhavam nas mãos de Saul; e o Senhor respondeu: 'Eles o farão'. Eis que Deus conhecia e revelou a Davi dois futuros contingentes que dependiam do arbítrio humano e que, no entanto, nunca aconteceram, nem acontecerão na natureza e, por isso, tampouco na eternidade. Além disso, isso pode ser demonstrado assim: prevendo os pecados em que os justos cairiam, se permanecessem por muito tempo nesta vida, muitas vezes Deus os remove deste mundo misericordiosamente, como lemos em Sabedoria 4,11: 'Ele foi arrebatado para que a maldade não pervertesse sua inteligência e para que o engano não seduzisse sua alma'. Um pouco mais adiante lemos: 'Sua alma era do agrado do Senhor; por isso Ele se apressou em tirá-lo do meio da maldade'. Portanto, como esses pecados estavam incluídos entre os futuros contingentes, como Deus os previu e como nunca ocorreriam, por tudo isso, Deus conhece os futuros contingentes não exclusivamente porque as coisas possuem existência na eternidade.
10. Sei que Cornélio Jansênio, assim como Santo Ambrósio, ao explicar esta passagem, fala da transferência de Enoque. No entanto, a explicação comum, assim como a de São Cipriano (De immortalitate, próximo ao final; Testimonia ad Quirinum, livro 4) e Santo Agostinho (Epistolae, 105 e 107; De praedestinatione sanctorum, cap. 14), fala da transferência dos justos por meio da morte. Leia-se Nicolau de Lira e Dionísio, o Cartuxo, em suas explicações desta passagem. Esta maneira de explicar a referida passagem concorda com o que é dito antes e depois no mesmo capítulo, e até mesmo com o que é dito no capítulo anterior e no posterior. Aquele que quiser enfraquecer o significado deste testemunho, deverá explicá-lo assim: 'Quando se diz para que a maldade... é como se dissesse não ser que a maldade perverta sua inteligência, e quando se diz para que o engano... é como se dissesse não ser que o engano seduza sua alma'; ou seja, como se ambas as coisas fossem duvidosas e incertas para Deus. Quem pode não ver que esta explicação da passagem de Sabedoria é dura, estranha e absurda, e que a maneira de explicá-la de Santo Agostinho (em sua Epistola 105 citada) é a legítima e a que os Doutores ensinam comumente, a saber: 'para que a maldade não perverta sua inteligência e para que o engano não seduza sua alma', como Deus previa que iria acontecer e, por isso, apressou-se em tirá-lo de entre as iniquidades, pois sua alma era do seu agrado? E mesmo que se estivesse falando da transferência de Enoque, esta passagem deveria ser explicada também deste mesmo modo e demonstraria nossa opinião.
11. Segunda demonstração: Através de sua ciência natural, Deus compreende a si mesmo e, em si mesmo, tudo aquilo que está nEle com eminência e, por isso, o livre arbítrio de qualquer criatura que pode criar graças à sua onipotência. Portanto, antes de qualquer determinação livre de sua vontade e em virtude da altivez de sua ciência natural, pela qual supera com infinitude cada uma das coisas que contém com eminência em si mesmo, Ele penetra aquilo que o livre arbítrio de cada criatura —dada a hipótese de que Deus queira colocá-la neste ou naquele ordem de coisas, com estas ou com aquelas circunstâncias ou auxílios— fará em função de sua liberdade inata, apesar de que, se assim o quisesse, poderia refrear este ato ou realizar o ato oposto; e se fosse fazer isso, como livremente pode, Deus veria isso mesmo e não o que realmente que fará. Pois seria indigno da altivez e da perfeição da ciência divina —e até mesmo ímpio e de forma alguma conforme a uma compreensão tão grande do livre arbítrio de cada uma das criaturas— afirmar que Deus ignora o que eu faria, em função da liberdade do meu arbítrio, se Ele me colocasse em outra ordem de coisas ou se, nesta mesma ordem de coisas em que me colocou, decidisse conceder-me auxílios maiores ou menores do que os que de fato decidiu conceder-me, ou se me concedesse uma vida mais longa ou me permitisse maiores tentações. Portanto, também antes de decidir algo por sua livre vontade, Ele conhece com certeza, graças à sua ciência natural, todos os futuros contingentes que vão acontecer ou não, mas não em termos absolutos, e sim dada a hipótese de que decida criar esta ou aquela ordem de coisas, com estas ou com aquelas circunstâncias; por isso, acontece que, como Ele escolheu livremente esta ordem de coisas que realmente escolheu, na própria escolha e no decreto de sua vontade —antes de que a partir deste momento, pelo menos segundo nosso modo de entender, mas com fundamento na realidade, apareça algo no tempo ou na eternidade segundo um ser real de existência—, Deus conheceu com certeza e de maneira absoluta quais coisas contingentes vão acontecer ou não. Portanto, para conhecer estas coisas com certeza, Deus não precisa que elas possuam uma existência na eternidade.
Mas somos obrigados a ir até a raiz última pela qual cremos que Deus conhece com certeza todos os futuros contingentes e pela qual, a menos que nos enganemos, na penúltima disputa faremos concordar claramente a liberdade de arbítrio e a contingência das coisas com a presciência divina.
12. Terceira demonstração: Deus não recebe seu conhecimento a partir das coisas, mas conhece tudo em si mesmo e a partir de si mesmo; portanto, a existência das coisas —seja no tempo, seja na eternidade— não faz com que Deus saiba com certeza o que vai acontecer ou não. Pois, como Deus tem em si mesmo —antes de toda existência de objetos— onde recorrer para conhecer tudo plenamente e com perfeição, daí se segue que a existência das coisas criadas não confere nenhuma perfeição ao conhecimento que Deus tem delas, nem produz nenhuma variação nesse conhecimento. Por isso, em Deus, o conhecimento intuitivo e o abstrativo —ou, melhor dizendo, de simples inteligência— não diferem de maneira alguma, mas apenas a partir da condição da existência ou não do objeto, um e o mesmo conhecimento —igualmente evidente e igualmente perfeito em si mesmo— é chamado de 'intuitivo' ou 'de simples inteligência', como explicamos em nossos comentários ao artigo 9. Mas, como em nós e nos anjos o conhecimento evidente das coisas futuras contingentes depende da existência delas e da experiência pela qual sabemos que essas coisas possuem existência na natureza em termos de uma existência real, daí se segue: que o conhecimento por experiência e intuitivo, tanto nos anjos quanto em nós, se distingue em espécie do conhecimento abstrativo; que seja muito mais perfeito do que este; e, por isso, que a existência dos objetos contribua para a perfeição do conhecimento que os anjos ou os homens formam, como explicamos em nossos comentários ao artigo mencionado e também em outros lugares.
13. Quarta demonstração: Em Deus providência e predestinação dos futuros contingentes. Portanto, uma presciência certa pela qual Ele sabe, antes que algo exista, o que vai acontecer ou não, dada a hipótese e a condição de conceder este ou aquele auxílio ou meio, ou de dispor as coisas de um ou de outro modo. Se não fosse assim, como Ele teria preordenado e disposto as coisas com sua providência, dirigindo os efeitos bons e contingentes através de causas tanto naturais quanto livres, e permitindo os efeitos maus, para que deles se seguissem bens maiores? Da mesma forma, como teria ocorrido a predestinação de algumas causas que agem livremente, para que alcançassem efeitos e fins contingentes, por uns ou por outros meios? Pois, assim como se o artesão não soubesse de antemão que tipo de artefato quer produzir de modo que, assim, possa, em sua produção, mover as mãos e os instrumentos de fabricação de uma ou de outra forma —, também não saberia aplicar esses meios para que o artefato resulte como ele deseja, assim também, se Deus não previsse antes de decidir, por meio do decreto livre de sua vontade, aplicar os meios e dispor as coisas do modo como realmente foram ordenadas o que aconteceria a partir de uma disposição e uma ordem tais, certamente, por meio de seu decreto, Ele não saberia ordenar as coisas do modo necessário para que alcançassem seus fins, mas, ao contrário, quase por acaso e além da ciência divina prévia, as coisas, segundo seu ser de existência, aconteceriam de um ou de outro modo indiferentemente, e Deus saberia como elas teriam acontecido a partir de sua existência; mas tudo isso é e deve ser julgado como absurdo e ímpio em grau máximo. Por essa razão, Deus sabe com certeza os futuros contingentes antes que algo exista, ou seja, antes do decreto livre de sua vontade, por uma ciência de certo modo natural e dada a hipótese de que Ele queira criar e dispor as coisas deste ou daquele modo no decreto livre que, como causa, antecede a existência dos futuros contingentes, tanto na eternidade quanto no tempo, de maneira absoluta e sem hipótese ou condição alguma.
14. Demonstração: Deus permite os pecados. Mas diz-se que permite aquele que prevê o que vai acontecer, se não o impede e não quer impedi-lo, podendo fazê-lo. Portanto, como os pecados devem ser incluídos entre os futuros contingentes, Deus conhece com certeza esses futuros, dada a hipótese de que não queira impedi-los antes que pelo menos por natureza ou, mais precisamente, segundo nosso modo de entender, com base na realidade possuam existência no tempo ou na eternidade. A conclusão que oferecemos pode ser corroborada ainda mais com o que vamos dizer em nossa próxima conclusão.
15. Segunda conclusão: Embora, no sentido explicado na disputa anterior, pudesse ser facilmente defendido que a proposição 'Todas as coisas que são, foram ou serão em qualquer momento do tempo, coexistem com Deus ou, segundo seu ser de existência, estão presentes para Deus de maneira extrínseca às suas causas' é verdadeira em qualquer instante em que é proferida com relação à eternidade uma vez que as cópulas 'coexistem' e 'são' não indicam o agora temporal em que são enunciadas, mas o agora da eternidade, não em sentido inadequado, ou seja, na medida em que o agora da eternidade corresponde de maneira precisa a este ou àquele instante ou parte do tempo, mas em sentido adequado, ou seja, como duração infinita que abrange a totalidade do tempo, tanto passado quanto futuro, apreendido com conhecimento —, no entanto, por um lado, considero que não é admissível que as coisas que acontecem no tempo possuam uma existência na eternidade antes de existirem no tempo ou que, segundo suas existências, estejam presentes para Deus na eternidade antes de estarem realmente presentes no tempo e, por outro lado, considero que Deus não presabe com certeza, em razão de que as coisas possuem existência na eternidade, os futuros contingentes antes de possuírem existência no tempo. Por isso, a proposição 'Todas as coisas coexistem desde sempre com Deus ou, segundo suas existências, estão presentes para Deus de maneira extrínseca às suas causas', no sentido que explicamos na disputa anterior, não conduz, segundo creio, a demonstrar a certeza da presciência divina dos futuros contingentes, nem a conciliar a contingência das coisas com a presciência divina.
16. A afirmar isso me motiva o seguinte. Em primeiro lugar: Além de que a existência das coisas criadas não confere absolutamente nada à ciência que Deus tem delas, nem Ele depende dessa existência, nem recebe dela qualquer perfeição —e, consequentemente, nenhuma certeza—, como explicamos, também não devemos considerar que as coisas que acontecem sucessivamente no tempo possuam uma existência na eternidade anterior a uma existência no tempo, de tal modo que, em virtude de alguma prolepse que delas —com respeito à sua existência e de maneira extrínseca às suas causas— se produzisse na eternidade, fossem conhecidas com certeza na eternidade, quando ainda são coisas futuras no tempo; no entanto, é necessário que isso seja verdade, para que, a partir da existência das coisas na eternidade, Deus as preveja com certeza antes que possuam existência no tempo.
Se Boécio, Santo Tomás e todos os outros que, pela razão mencionada, afirmam que Deus conhece com certeza os futuros contingentes, quiseram realmente dizer isso, declaro ingenuamente que não entendo e penso que tal coisa não pode ser verdadeira de modo algum. Pois, opinando assim, teríamos que admitir que, quando a cópula 'é' indica um instante de tempo presente, a proposição 'Todas aquelas coisas que acontecerão ou serão durante a totalidade do decurso do tempo, estão seguras em seu ser de existência na eternidade' seria verdadeira, porque, embora no instante do tempo em que essa proposição fosse proferida, ainda não existissem no tempo aquelas coisas que ainda são futuras, no entanto, nesse mesmo instante do tempo, elas estariam na eternidade devido à existência conhecida por prolepse e em virtude da qual as coisas possuem existência na eternidade antes de acontecerem no tempo. Embora muitos pareçam admitir isso e ainda usem esse mesmo modo de falar, no entanto, não creio que isso possa ser admitido, conforme o que dissemos na disputa anterior, nem creio que seja verdade. Pois, como as coisas que acontecem sucessivamente no tempo não têm outras causas das quais dependa sua presença na eternidade em termos de ser de existência, além daquelas mesmas que as produzem no tempo; como essas causas não as produzem na eternidade segundo outro ser de existência ou por meio de uma produção que difira daquela que, segundo o mesmo ser de existência, as produz no tempo; como também não as produzem na eternidade conferindo-lhes um ser de existência —por assim dizer— dentro da eternidade, isto é, dentro do próprio Deus, que é sua eternidade, pois isso seria ridículo e ímpio, mas, enquanto as produzem na duração do tempo, ao mesmo tempo fazem com que possuam existência na duração da eternidade, porque, como a eternidade é indivisível e infinita e, consequentemente, em sua totalidade coexiste com a totalidade do tempo de tal modo que a eternidade em sua totalidade coexiste com cada uma das partes e dos momentos do tempo, não pode acontecer que algo possua existência no tempo sem que também a possua na duração da eternidade; assim, como digo, que tudo isso é assim, não se deve pensar que a duração infinita da eternidade, que abrange a totalidade do tempo, exista toda ela simultaneamente no seguinte sentido, a saber, como se atraísse e fizesse que nela mesma as coisas futuras existissem de maneira extrínseca a suas causas, antes de acontecerem no tempo —pois isso seria totalmente incrível, teria sido inventado sem necessidade alguma e eliminaria a liberdade de arbítrio e a contingência das coisas, como imediatamente vou demonstrar—, mas neste sentido, a saber: toda a eternidade coexiste com a totalidade do tempo e com cada uma de suas partes, quando cada parte possui existência por si mesma e não antes, não por algum defeito da eternidade, mas porque essa parte do tempo ainda não existe por si mesma e em termos absolutos.
17. Pode-se facilmente demonstrar que a liberdade do nosso arbítrio e a contingência das coisas desaparecem totalmente, se alguém afirmar, em primeiro lugar, que, como a eternidade existe simultaneamente em sua totalidade, nela as coisas existem antes que no tempo, de tal modo que todas aquelas coisas que vão acontecer no tempo, neste momento do tempo ─ou melhor, desde sempre─ estariam presentes na eternidade de maneira extrínseca às suas causas e segundo suas verdadeiras existências; e, em segundo lugar, que isso seria assim com tanta segurança que, a partir dessa raiz, Deus conheceria com certeza as coisas que vão acontecer no tempo de maneira contingente. Pois nem o livre arbítrio, nem as demais causas, poderiam a partir de então agir, se essas mesmas causas não agissem em um tempo futuro da mesma forma ─do mesmo modo e através da mesma ação─ que antes teriam agido na eternidade; e se pudessem agir de outro modo, certamente, isso não estaria presente na eternidade com tanta segurança que não pudesse não estar e, por isso, a partir de uma existência tal das coisas na eternidade, a ciência divina não poderia possuir uma certeza sobre o que acontecerá de maneira contingente no tempo.
18. Em segundo lugar: As coisas que, após um dia, vão acontecer no tempo de maneira contingente, até esse dia podem acontecer ou não indiferentemente, tanto no tempo quanto na eternidade. Pois o ato do meu livre arbítrio que vai se produzir amanhã ainda pode não acontecer no tempo; caso contrário, não seria algo que aconteceria no tempo de maneira contingente. Mas como não existe na eternidade, exceto por meio do ser que vai possuir no tempo, por isso, na realidade, pode não estar presente na eternidade; caso contrário, não seria algo que aconteceria no tempo de maneira contingente. Portanto, a ciência pela qual Deus sabe que este ato vai se produzir amanhã não possui até o dia de hoje uma certeza —com ausência de toda dúvida— em virtude da existência deste ato na eternidade, porque este ato poderia não estar presente na eternidade. Portanto, a existência das coisas na eternidade não é a raiz de que Deus saiba com certeza as coisas que ainda são no tempo futuros contingentes.
Pois, quando as cópulas indicam o agora da eternidade e dizemos que todas as coisas, tanto presentes, como passadas e futuras, possuem uma existência no tempo e simultaneamente na eternidade, isso deve ser entendido em referência à eternidade no sentido adequado, ou seja, na medida em que a eternidade corresponde à totalidade do tempo. De fato, embora a eternidade exista e tenha existido até o dia de hoje, na medida em que corresponde ao momento presente e à totalidade do tempo passado, no entanto, ainda não existe, no que diz respeito à correspondência com o tempo futuro, mas não porque esteja ausente a parte da eternidade que corresponde ao tempo futuro, e sim porque ainda não está presente o tempo futuro com o qual deve corresponder-se.
Temos um exemplo adequado disso, se observarmos o ponto central em relação à circunferência que é traçada ao seu redor, aos quais, segundo se diz, se assemelham a eternidade indivisível e o tempo que transcorre e flui ao redor dela. Pois, da mesma forma que, ao traçar uma circunferência, seu ponto central ainda não corresponde à parte que ainda deve ser traçada, mas apenas à parte traçada isso ocorre não porque ao ponto central falte algo em razão do qual devesse corresponder-se com a parte que deve ser traçada, mas porque falta a própria parte com a qual este ponto deve corresponder-se, que possui uma existência por si e em sua totalidade, embora, uma vez traçada toda a circunferência, o centro corresponder-se-á com a totalidade da circunferência e com cada uma de suas partes —, assim também, a eternidade indivisível, enquanto ainda não transcorreu a totalidade do tempo, não corresponde com ele em sua totalidade, mas com a parte transcorrida. Por isso, da mesma forma que o ponto central pode nunca corresponder-se com a parte da circunferência que ainda não foi traçada, caso nunca venha a sê-lo em um tempo futuro, assim também, a eternidade pode não corresponder-se com as partes que ainda devem ocorrer de um tempo real ou com as coisas que vão acontecer nelas de maneira contingente, se o tempo real cessar ou se, durando este tempo, tais coisas não acontecerem nele, como realmente pode ocorrer.
Por tudo isso, é evidente que, se as cópulas indicam o agora da eternidade e consideramos esta em sentido adequado ou seja, na medida em que corresponde à totalidade do tempo, apreendido também pelo pensamento —, embora a proposição 'Tudo o que acontece no tempo está presente para Deus ou possui uma existência na eternidade' seja verdadeira em termos absolutos, porque quaisquer coisas que aconteçam no tempo sejam mais, sejam menos —, por essa mesma razão, necessariamente devem existir na eternidade, que abrange a totalidade do tempo, no entanto, se falamos de algo que ainda deve acontecer no tempo de maneira contingente por exemplo, o pecado de Pedro que ocorrerá amanhã —, a proposição 'Este pecado está presente para Deus ou possui uma existência na eternidade' não será verdadeira em termos absolutos, mas apenas sob a suposição de que acontecer no tempo; pois, assim como ainda pode não acontecer no tempo, também pode não existir na eternidade, se considerarmos esta em termos adequados.
19. Em terceiro lugar: Se todas as coisas que vão acontecer no tempo estivessem desde sempre presentes para Deus ─segundo suas próprias existências e de maneira extrínseca às suas causas─ por meio de uma prolepse na eternidade, graças à qual a presciência divina possuiria uma certeza em relação a coisas que ainda são futuros contingentes no tempo, então neste agora temporal nosso haveria infinitas coisas em ato ─extrínsecas às suas causas─, que não possuiriam uma existência neste agora temporal como medida de sua existência real, mas uma existência no agora da eternidade ─do modo mencionado─ e neste agora temporal nosso como medida da existência dessas coisas na eternidade do modo mencionado; mas parece totalmente absurdo e contraditório admitir que neste agora temporal nosso haveria infinitas coisas que estariam em ato na eternidade.
20. Por tudo o que foi dito, é evidente o que afirmamos no final de nossos comentários ao artigo 9 da questão 14, a saber: A ciência divina das coisas que ainda são —de maneira contingente— futuras no tempo, ainda não pode ser considerada propriamente ciência de visão —até que essas coisas existam em ato dentro do tempo—, mas apenas de simples inteligência, porque as coisas que são objeto dessa ciência ainda não existem. No entanto, como a duração própria dessa ciência é a eternidade e na eternidade —na medida em que coexistirá com o tempo futuro— essas coisas acabarão se tornando presentes, em termos absolutos a ciência divina pode ser denominada 'ciência de visão' com relação a todas as coisas que acontecerão em algum momento do tempo; assim denominamos sempre essa ciência, de acordo com o parecer comum dos Doutores.
21. Também devo advertir o seguinte: Embora São Jerônimo em seus primeiros comentários sobre Efésios, I, 4: 'porque nele nos escolheu' diga: 'Deu testemunho de que fomos escolhidos para ser santos antes da criação do mundo, e isso é obra da presciência divina, para a qual todas as coisas futuras foram feitas e todas elas lhe são conhecidas antes de acontecerem'; e embora também, em seus comentários posteriores, referindo-se à mesma passagem, diga: '... porque para Ele não nada novo, pois todas as coisas estavam nEle antes de acontecerem'; no entanto, não se deve entender essas palavras como se essas coisas pré-existissem em termos de uma existência real, mas sim que pré-existiriam e seriam conhecidas com evidência em seu ser objetivo. Pois, da mesma forma que, sobre as coisas que não existem, de certa forma se diz que existem em relação ao poder divino, que chama ou concede existência às coisas que não existem, assim como às que existem, da mesma maneira, como a Deus não se ocultam as coisas que não existem, mas Ele as conhece com evidência exatamente como se existissem, São Jerônimo afirma que elas pré-existem na ciência divina. Daí que, após essas palavras, ele acrescente: 'As almas não foram separadas no céu, como alguns hereges deliram'. E em seus comentários sobre o Eclesiastes (I, 10), ele afirma: 'Deve-se dizer que o que vai acontecer foi feito em virtude da presciência e da predestinação de Deus'. O mesmo afirma São Cirilo (Thesaurus, lib. 5, cap. último).
22. Além disso, contra a opinião mencionada de Santo Tomás, Escoto argumenta assim: 'Porque da mesma forma que a eternidade existe em sua totalidade simultaneamente e coexiste com o tempo passado e com o futuro, assim também, o evo do anjo existe em sua totalidade simultaneamente e coexiste com o tempo passado e com o futuro. Portanto, da mesma forma que, a partir da existência na eternidade das coisas que ainda são —de maneira contingente— futuras no tempo, Deus previu com certeza —antes que possuam uma existência no tempo— que vão acontecer, assim também, a partir da existência dessas coisas no evo do anjo, ele previu com certeza —antes que possuam uma existência no tempo— que vão acontecer.'
23. A este argumento, os discípulos de Santo Tomás costumam responder assim: Como o conhecimento do anjo não tem sua medida em um evo, mas em um instante de tempo discreto, e o conhecimento divino tem sua medida na eternidade, na qual existem em ato as coisas que são —de maneira contingente— futuras no tempo, esses dois conhecimentos não admitem comparação. Mas, como o anjo poderia estar em posse simultânea de uma totalidade de conhecimento que coexistisse completamente com o evo ou que, por comparação com nosso tempo, durasse tanto quanto durasse o evo, não parece que essa refutação seja correta, principalmente porque, se as coisas futuras sempre coexistem —segundo seu ser de existência e de maneira extrínseca a suas causas— com o evo do anjo, como coexistem com a eternidade de Deus, então o anjo, com seu conhecimento, as apreenderia estando estas em posse de uma existência em seu evo de maneira extrínseca a suas causas e, por isso, antes que acontecessem no tempo, as conheceria com certeza, embora não por meio de um conhecimento cuja duração fosse a de seu evo, mas por meio de um conhecimento cuja duração seria a de um agora temporal discreto.
24. No entanto, seria melhor responder que o evo do anjo não possui por si mesmo uma amplitude de duração, mas depende do tempo maior ou menor que Deus conserve o anjo; daí que o fato de o anjo coexistir com o tempo futuro depende não apenas da existência futura do tempo, mas também de que Deus conceda o ser ao anjo ou o conserve no tempo futuro; por outro lado, a eternidade é por si mesma uma duração infinita; explicamos essas duas coisas em nossos comentários à questão 10. Disso se segue que, em ambos os casos, difere a razão pela qual as coisas que ainda são futuras no tempo não coexistem neste momento do tempo com o evo do anjo, como coexistem com a eternidade. Esta resposta pode ser dada se dissermos que a natureza da eternidade é tal que por si mesma faz anteceder as próprias coisas que vão acontecer no tempo, como necessariamente se deve dizer, se de alguma forma deve ser defendida a opinião de Boécio e de Santo Tomás; pois, embora isso fosse atribuído à eternidade, de modo algum deveria ser atribuído ao evo do anjo, pela razão que acabamos de apresentar.