Neemias 6

Quando Sanabalat, Tobias, Gosem, o árabe, e outros inimigos nossos souberam que eu havia reconstruído as muralhas e que não havia mais nenhuma brecha, embora nesta data eu não tinha ainda fixado os batentes nas portas,
Sanabalat e Gosem enviaram-me esta mensagem: “Vem para um encontro em Cefirim, no vale de Ono”. Mas eles pensavam em fazer- -me mal.
*
O vale de Ono ficava a cerca de 40 km de Jerusalém. A proposta de Sambalate era uma armadilha: reunir-se longe da obra para sabotar Neemias. A expressão 'vale de Ono' em hebraico soa como 'vale de problemas', sugerindo duplo sentido intencional.
Enviei-lhes, pois, mensageiros com esta resposta: “Estou ocupado num grande trabalho e não posso descer: por que haveria de cessar a obra, quando eu a deixasse para ir até vós?”
Quatro vezes mandaram-me o mesmo convite e dei-lhes a mesma resposta.
Então Sanabalat mandou- -me dizer a mesma coisa pela quinta vez, por meio de seu servo, que tinha nas mãos uma carta aberta,
na qual estava escrito: “Ouve-se dizer entre as nações, e Gasmu o confirma, que tu e os judeus pensais em rebelar-vos, e é por isso que estais reconstruindo as muralhas; que tu serias o rei deles
*
A acusação de rebelião era grave, pois a Pérsia punia severamente revoltas (Esdras 4:19-22). Gasmu é Gesém, líder árabe mencionado em inscrições do século V a.C. como 'Gashmu rei de Qedar', corroborando seu papel histórico.
e terias até mesmo constituído profetas para proclamarem a teu respeito em Jerusalém: ‘Há um rei em Judá!’ Agora esses boatos vão chegar aos ouvidos do rei: vem, pois, e entendamo-nos”.
*
Afirmar que Neemias se tornaria rei era acusação capital, pois Judá era província persa. Séculos depois, Jesus também seria falsamente acusado de pretender realeza (João 19:12).
Mas mandei responder-lhe: “Não aconteceu isto que afirmas, mas tu o inventas em teu espírito”.
A verdade é que eles todos queriam amedrontar-nos, pensando: “Suas mãos desistirão do trabalho, que jamais será terminado”. No entanto, dava-se o contrário: eu fortalecia minhas mãos!
Um dia fui à casa de Semaías, filho de Delaías, filho de Metabeel, que se havia encerrado lá dentro. Ele declarou: “Reunamo-nos no templo de Deus, no interior do santuário; fechemos as portas do santuário, porque virão para te matar, sim, esta noite, virão te matar!”
*
Semaías estava 'encerrado' (hebraico 'asar'), termo que pode indicar restrição ritual ou prisão domiciliar. Profetas às vezes se isolavam para êxtase religioso (1Samuel 19:24), mas aqui parece estratégia para criar urgência falsa.
Mas eu respondi: “Um homem como eu há de fugir? E qual é o homem de minha condição que entraria no santuário para salvar sua vida? Não, não irei!”
Reconheci que não era Deus que o tinha enviado, mas que ele pronunciara este oráculo contra mim porque Tobias e Sanabalat o haviam subornado.
*
Neemias detecta suborno - prática comum em disputas políticas. A Lei proibia suborno (Êxodo 23:8), mas Tobias e Sambalate usaram táticas similares às relatadas em cartas de Elefantina (papiros judaicos do século V a.C.).
Fora subornado para amedrontar-me e levar-me a agir daquele modo e pecar, para criar- -me uma reputação má e expor-me à desonra.
Lembrai-vos, meu Deus, de Tobias e de Sanabalat, pelo que cometeram; e também de Noadias, a profetisa, e dos outros profetas que quiseram intimidar-me.
*
Noadia é a única profetisa mencionada em Neemias. Nada se sabe dela fora da Bíblia. A menção a 'lembrar' os inimigos reflete prática comum em orações de imprecação (Salmo 109:14-15).

Término das muralhas.

As muralhas ficaram prontas no dia vinte e cinco de elul, em cinquenta e dois dias.
*
52 dias para reconstruir muros é plausível? Escavações de Eilat Mazar (2007) encontraram estruturas do período persa sobre muros antigos, sugerindo reparos rápidos em fundações existentes, não construção do zero.
Quando todos os nossos inimigos o souberam e todas as nações em torno de nós viram isto, sentiram-se fortemente humilhados e reconheceram que este trabalho fora realizado graças a nosso Deus.
Por essa época os nobres de Judá mandavam muitas cartas a Tobias e as de Tobias lhes chegavam às mãos;
pois ele tinha em Judá muitos aliados, sendo genro de Sequenias, filho de Area, e tendo seu filho Joanã desposado a filha de Mosolam, filho de Baraquias.
*
Alianças matrimoniais eram estratégia política. Tabelas de el-Amarna (século XIV a.C.) já mostravam casamentos entre elites de diferentes regiões para consolidar poder, prática que persistiu no período persa.
Até mesmo em minha presença enalteciam suas boas ações e lhe transmitiam minhas palavras. Tobias mandava cartas para me intimidar.